“… Cristina, mostra para mamãe o au au…”
Eu estava sentada no chão, com minha mãe bem atrás de mim e a minha frente havia várias figurinhas diferentes espalhadas. Ela me incentivava, por meio de uma brincadeira divertida, a ouvir sem olhar para ela. Quando eu achava a figura que ela pedia, era uma alegria e risada sem fim, porém quando ficava na dúvida ou errava, pacientemente ela repetia devagar, bem próximo ao papapá, que era como chamávamos o aparelho auditivo. É essa imagem que tenho forte de uma infância rica de aprendizado, alegria e amor. Cada dia era uma nova descoberta de um mundo de sons, graças à minha mãe. Ela sempre foi persistente, guerreira, batalhadora e jamais se deu por vencida.
Uma das importantes recomendações que minha mãe recebeu quando eu tinha apenas um ano e meio de idade, veio do otorrinolaringologista Dr.Orozimbo Alves da Costa Filho. A sugestão, bastante incomum para a época, foi matricular-me em uma escola regular. Afinal, conviver e aprender a se virar junto a outras crianças, sempre foi algo fundamental no processo de desenvolvimento infantil.
Assim, com a ajuda de aparelhos auditivos desde essa ocasião, eu fui introduzida precocemente ao mundo dos sons e, mesmo sem ter tido uma infância ouvinte, sempre estudei em escolas regulares. Outro recurso que contribuiu com meu processo de oralização, foi um diário que minha mãe fazia, narrando meu desenvolvimento e anotando cada fala, para me ajudar a compreender a discriminação de novos sons e ruídos. Todo o empenho e dedicação deram tão certo que, aos 22 anos, me formei em jornalismo. E não há como negar, que a área de Comunicação Social representa um grande desafio para pessoas com deficiência auditiva. É claro que muitos me questionam sobre como isso se tornou possível e a resposta é bem simples: “estudando!”.
Atualmente, sou também palestrante e escritora. Além de ter total fluência em português, também me viro muito bem na língua inglesa. Sou autora de minha própria biografia, que foi lançada nas livrarias no final do ano passado sob o título: “Quem é essa Tagarela?”, indicando que silêncio não tem nada a ver comigo. O livro aborda minha trajetória, incluindo importantes questões de vida, como a convivência com familiares e amigos, os valores, as lutas e conquistas, trabalho e viagens internacionais inesquecíveis.
Com o objetivo de ampliar a motivação e o interesse pela oralização de surdos e deficientes auditivos, também criei um site, para incentivar o uso de aparelhos auditivos e a importância do diagnóstico precoce. Quero compartilhar minha história com o público e divulgar o que é ser um deficiente auditivo com perda profunda e, ser oralizada. No Brasil, grande parte das famílias ainda tem de lidar com barreiras e dificuldades financeiras. Muitos desanimam ou são desmotivados a usar aparelhos auditivos e, consequentemente, a falar. Porém, o principal de tudo é tentar e ACREDITAR! Garanto.
A palavra “preconceito” sempre caminha junto à falta de informação e de conhecimento. E é isso o que faz da minha obra um importante instrumento de apoio à inclusão, especialmente por mostrar o dia a dia de quem precisa usar muito jogo de cintura para lidar com os mais diversos tipos de desafios.
Nessa fase atual em que me encontro, recebi um convite da Audibel, para usar o aparelho auditivo Boost – a Paula usou o mesmo AASI antes de fazer o segundo implante coclear e contou tudo neste post. O resultado da adaptação foi imediato e tranquilo. Logo no primeiro dia de uso do Boost, já senti diferença ao ouvir melhor a minha própria voz. Pessoas de minha família e algumas amigas notaram diferença no volume e no tom da minha fala. Com o recurso de conectividade ao iPhone, notei diferença ao ouvir melhor a voz da pessoa com quem falava, ao ligar pelo Facetime.
Gosto de ouvir e conversar com as pessoas, sair com amigas para jantar, passear e levo uma vida social bem ativa. Também, no meu trabalho, preciso interagir com um público grande em palestras, eventos e, além disso, trabalho com famílias de pessoas com deficiência. O Boost me ajudou a ter mais praticidade no meu dia a dia. Como usuária de aparelhos auditivos, já levava uma vida normal, porém com o uso do Boost senti mais facilidade, com seus recursos inovadores e sua possibilidade de conectividade com o iPhone.
Um ótimo exemplo dessa tecnologia é que ele possui programas que podemos selecionar no próprio aparelho auditivo ou pelo iPhone. Um deles, é o “restaurante”, com o qual eu consigo ouvir melhor a fala das pessoas em ambientes ruidosos e assim interajo e participo das conversas entre os amigos. Outro programa que faz parte do próprio iPhone, através do Bluetooth, tem um recurso chamado “ouvir ao vivo”, ideal para uma reunião de negócios, que envia ao aparelho auditivo o áudio captado pelo microfone do iPhone e que pode ser deixado sobre a mesa, direcionado para as pessoas. Sinto-me mais integrada que antes, quando estou em grupo.
Além da conectividade com o iPhone, há também um aparelho de Audio Link, que me auxilia durante a ginástica, por exemplo, para ouvir melhor a voz do meu personal. Ele fica com o esse aparelho preso em sua camiseta, enquanto escuto sua voz direto nos meus aparelhos auditivos. Achei interessante, também, ter no aplicativo do meu celular vários recursos, tais como controle visual de bateria, através do qual posso ver no desenho se a bateria está acabando ou não. Outra grande vantagem é poder controlar o volume e a intensidade do grave ou agudo pelo próprio iPhone. Se, por acaso, eu me esquecer onde guardei ou deixei os aparelhos auditivos ao tirá-los para dormir, há um recurso inovador de “buscar” os aparelhos auditivos. E há ainda vários outros recursos que vou descobrindo a cada dia e adorando, pois, me permitem ter uma vida mais ativa e participativa.”
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